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Relação trópicos - ambiente polar

Sinal da atividade de ciclones extratropicais explosivos na criosfera Antártica

 

Desde 2012, o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia da Criosfera opera um laboratório remoto no Centro da Antártica, a cerca de 600 km do Pólo Sul, objetivando a monitoração climática e a caracterização dos aerossóis atmosféricos, visto que na Antártica é possível obter o registro de diversos fenômenos de impacto global sobre a atmosfera. Eventos vulcânicos, explosões nucleares, variações da atividade solar e o impacto humano sobre o ambiente têm sido largamente registrados na atmosfera e no gelo antártico. Dentro da estratégia de pesquisa científica no Criosfera 1, monitora-se micropartículas de origem mineral que chegam a Antártica pois vários estudos pretéritos sugerem que tais materiais derivam dos continentes ao redor deste continente, sendo a América do Sul o principal elemento fonte.

 

 

Laboratório autônomo Criosfera 1 implementado na missão INCT2011-2012 na latitude 85S, no centro da Antártico. Sua principal missão é o monitoramento climático, o estudo da química da atmosfera e desenvolver atividades multidisciplinares na área de microbiologia polar e raios cósmicos.

Dentre o espectro de fenômenos naturais de relevância, os Ciclones extratropicais tornara-se uma realidade para o Brasil e para os gestores da ocorrência de eventos extremos. Este tipo de fenômeno ganhou grande importância para a comunidade científica e demais ramos da sociedade após o surgimento do furação (ciclone extratropical para outros) Catarina em 2004, o primeiro registrado no Brasil e acompanhado em detalhes nesta categoria. Este fenômeno afetou direta e indiretamente 270 mil pessoas. Recentemente, e mais precisamente em 2015, um grande ciclone extratopical atingiu a região (sub)tropical da América do Sul, atingindo parte do Brasil com grandes conseqüências para o clima da região Sul, sua economia, e deixando um rastro de destruição e populações desabrigadas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ciclone extratropical é um fenômeno meteorológico caracterizado por fortes tempestades e ventos em larga escala espacial. Ocorrem nas regiões de latitudes médias, onde constituem uma parte importante da circulação atmosférica ao contribuírem para o equilíbrio térmico das regiões equatoriais e das regiões polares. Na foto, um ciclone extratropical na região do Prata, próximo ao Sul do Brasil.

Abaixo um mapa ilustrando a densidade de cyclones explosivos no Hemisfério Sul (escala de cinza). As trajetórias foram baseadas em resultados do modelo JRA-25 (re-análise) para o período 1979–2008 (total de 496 trajetórias), Allen et al, Journal of Climate, 2010. Pode-se claramente observar a alta densidade nas médias latitudes na América do Sul.

O acompanhamento minucioso do fenômeno de 2015 nos mostrou que a presença de ciclones extratropicais em Novembro próximo a costa da região Sul do Brasil e da Bacia do Prata altera significativamente a dinâmica dos ventos no Atlântico Sul de forma a favorecer o aparecimento de correntes de vento no sentido América do Sul - Antártica. A equipe do Criosfera 1 acompanhou passo a passo a movimentação do ciclone com monitoração simultânea na Antártica. Neste episódio verificamos que ventos gerados em torno do ciclone podem claramente atingir regiões tão distantes como o Centro da Antártica, tal como ilustrado pelas linhas de trajetórias de massas de ar do período do episódio.  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 Trajetória de massas de ar descendentes (e respectivas altitudes, abaixo) entre o ciclone extratropical na América do Sul e o centro da Antártica, modelada pelo Hysplit-NOAA para Novembro de 2015.

Além das linhas que representam as correntes de ar entre as duas regiões (subtropical e polar), a equipe determinou outros indicadores que evidenciam a presença e ação de larga escala do Ciclone extratropical a partir de latitudes médias: A primeira através de uma sofisticada análise isotópica das poeiras minerais que chegaram ao Criosfera 1 na mesma época, ressuspensas durante a passagem do ciclone, e devido sua alta energia, ascendidas e lançadas a grandes distâncias geográficas;  segundo a presença de bioaerossóis, especificamente polens, que tal como as poeiras finas, foram ascendidos e transportados para as latitudes austrais. As razões dos isótopos radiogênicos de 87Sr/86Sr e 143Nd/144Nd nas micropartículas de poeira que chegaram ao Criosfera 1 durante o episódio, tem exatamente a mesma assinatura geoquímica das poeiras da região do Norte da Argentina e Uruguai caracterizas pela presença de loess (depósitos inconsolidados de sedimentos finos produzidos pela atividade eólica) e pelo bioma pampa (extensas planícies de vegetação rasteira). Para este trabalho, a equipe inventariou todos os grandes domínios geológicos da América do Sul para estes isótopos e comparou com o material que chegou a Antártica. Ficou absolutamente claro a presença de material terrígeno das localidades sob influência dos ventos do ciclone.  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Região entre a América do Sul e o continente Antártico. Cada ponto representa um (ou um conjunto de dados) das razões isotópicas de 87Sr/86Sr e 143Nd/144Nd (marcador de origem mineral). Em lilás os pontos com similaridade aos dados encontrados no Criosfera 1 durante o episódio do ciclone extratropical. Os minerais e as rochas tem razões distintas razões de 87Sr/86Sr e 143Nd/144Nd, de acordo com a derivação geológica. Essas razões não estão sujeitas ao fracionamento isotópico decorrente do intemperismo quando aplicado aos estudos de curta escala de tempo. Além disso, a composição dos isótopos de Sr e Nd da litosfera são significativamente diferentes do manto, o que permite a distinção entre as suas origens litológicas das zonas vulcânicas juvenis e dos velhos escudos continentais.

Para corroborar o resultado, a equipe detectou pela primeira vez pólen de ambiente (sub)tropical no centro da Antártica, durante o episódio de 2015, o que trata-se de um resultado inédito na literatura palinológica antártica. O termo palinologia é usado para definir o estudo morfológico da parede dos grãos de pólen e esporos, recentes ou encontrados na forma fóssil em ambientes sedimentares. As mostras de neve referentes aos meses de Outubro a Dezembro de 2015 no Criosfera 1 mostraram a presença de palinomorfos, muitos identificados como de origem do Setor Norte da Patagônia. Tal região é conhecida da literatura antártica por ser forte emissora de poeira mineral para a Antártica. As análises permitem afirmar que os grãos de pólen e esporos encontrados são procedentes de áreas abertas, propícias a ações do vento nas quais ingressam nas correntes atmosféricas.

Palinomorfos registrados do Criosfera1: Pólen indeterminado – A e B; Pólen indeterminado – C. Vetor demonstrando área rompida no grão de pólen. Escala: 10 microm.

Sabemos que o manto de gelo antártico opera como um testemunho de vários fenômenos naturais que por impactarem a atmosfera deixam um registro nos depósitos das sucessivas camadas de gelo. Tais camadas estão associadas a diferentes períodos de deposição que cobrem escalas de tempo anual, decadal e milenar. Assim, sinais de vulcanismo, meteoros, explosões nucleares, eventos solar e atividade humana nos continentes são encontrados no gelo da Antártica. Os dados combinados de pólen/esporos (cuja biogeografia é relativamente bem definida) e isótopos radiogênicos de Sr e Nd tal como ilustrado aqui podem servir como ferramenta para se investigar a ocorrência e freqüência de fenômenos de ciclones extratropicais que ocorreram no passado e partir daí mostrar sua evolução no tempo, potencial impacto sócio-econômico, e sua associação com as mudanças climáticas recentes.

 

 

Equipe:

 

Prof. Heitor Evangelista - Uerj

Mestranda Kamila Matta – Museu Nacional/UFRJ - Uerj

Dra. Claudia Barbieri Ferreira Mendonça – Museu Nacional/UFRJ

Dra. Vânia Esteves – Museu Nacional/UFRJ

Prof. Claudio Valeriano - Uerj

MS. Franco Nadal – INMET

Mestranda Carla Cristine Aguiar Neto - Uerj

Eng. Heber Reis Passos - INPE

Ms. Alerson Rodrigues – UFF - Uerj

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